A língua e eu somos um casal de amantes que juntos procriam apaixonadamente,
mas a quem até hoje foi negada a benção eclesiástica e científica.
Entretanto, como sou sertanejo,
a falta de tais formalidades não me preocupa.
Minha amante é mais importante para mim. (Guimarães Rosa).
Somos, tal qual Rosa, amantes das línguas, em todas as suas nuances. Compreender, explicar, identificar, caracterizar, descrever e diagnosticar as línguas, suas comunidades linguísticas e seus contextos socioculturais são objetivos que cerceiam o Projeto de Pesquisa Línguas indígenas do Cone-Sul de Rondônia.
Nossos pesquisadores pensam, portanto, a língua como prática social, o que equivale a pensar também a identidade de um povo. Identidade que se constrói pelo uso linguístico, identidade esmagada por línguas outras, identidade que clamam por resistir, mesmo que entre sussurros.
Murmúrios que são a gênese da nossa pesquisa, que intenta produzir conhecimento sobre as línguas indígenas do Cone-Sul de Rondônia, visando ao fortalecimento da identidade das comunidades indígenas que, por aqui, são muitas... “criticamente em perigo” (1, 4, 5, 6 e 7), “definitivamente ameaçadas” (3) ou “em estado moribundo” (2), valendo-nos dos termos dos graus de vitalidade / risco expostos por Eberhard (2013).
Fonte: Adaptado de Vetores-IBGE e ANA LÍNGUAS-Rodrigues (1986); Cabral (2010); Rodrigues e Cabral (2012).
Como bem disse Ruy Barbosa: “A degeneração de um povo, de uma nação ou raça, começa pelo desvirtuamento da própria língua”. Pensar, então, na situação das línguas indígenas no Brasil, ameaçadas e em situação precária, é ponto fundamental para se evitar a perda de aspectos culturais que são parte importante da identidade brasileira. Conhecer as línguas indígenas significa, portanto, conhecer também a representação social, política e cultural do Brasil.
Nessa linha de pensamento, nosso percurso se inicia pela língua Aikanã, ou Aikaná, ou Masaká, ou Kasupá, ou Huarí, ou Corumbiara, ou Mondé, ou Tubarão, cujo povo vive na Terra Indígena Tubarão/Latundê, localizada no município de Chupinguaia/RO, abrigando, conforme Censo da FUNAI (2017), em torno de 200 habitantes, distribuídos nas três aldeias, Tubarão, Rio do Ouro e Latundê, próximas umas das outras, e em que ainda se fala a “língua tradicional”, mesmo que o número de falantes seja reduzido (AIKANÃ, 2015).
Referências
AIKANÃ, Carlos. Terra Indígena Tubarão Latundê, seus recursos naturais e uma proposta de Plano de Gestão Ambiental e Territorial. 55 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Educação Intercultural) – Departamento de Educação Intercultura, Fundação Universidade Federal de Rondônia, Ji-Paraná, 2015.
EBERHARD, David M. Em defesa das línguas minoritárias do Brasil. Anápolis, GO: Associação Internacional de Linguística/SIL, 2013.
FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO. Censo populacional da Terra Indígena Tubarão Latundê. Vilhena, RO: Fundação Nacional do Índio – Coordenação Técnica Local em Vilhena – RO, 2017. 12 p. Relatório.
ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. p. 8.